segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

Até sempre e bom 2014!


Este blogue teve o seu tempo. Foi um blogue interventivo, à esquerda, de opinião e debate de ideias. Em vários momentos inovou, muito devido a alguma ousadia, ao espírito de convergência, ao humor e a uma forte preocupação em fundamentar argumentos, o que nem sempre sucede no espaço público. Por isso, pela intensidade e qualidade do trabalho da equipa, foi elogiado por outra parte da blogosfera e considerado seu interlocutor, tanto à esquerda como à direita, o que é o reconhecimento mais gratificante (e justo) para quem anda ou andou nestas lides. Resultou da confluência de bloggers vindos de muitos outros blogues, uns pessoais outros colectivos. Era um blogue tão aberto e que sentia tanto a urgência do debate de ideias que a certa altura chegou a debates dilacerantes que levaram alguns a afastar-se. Entretanto, com os compromissos profissionais e pessoais da maioria, o blogue perdeu o sentido para que fora criado. Não vem mal ao mundo por isso. Outros blogues e fóruns se sobrepuseram e aí estão a dar cartas, perdão, posts. É assim mesmo. A preocupação cívica e participativa que animou este espaço continua presente em muitos dos seus colaboradores, alguns estão agora noutros blogues, em movimentos cívicos e/ou políticos, em carreiras especializadas que envolvem debate de políticas públicas, etc. O que significa que as preocupações de outrora se mantêm: um mundo melhor, mais justo, aberto e fraterno.

Há algum tempo que estava para escrever este texto, como justificação mínima aos leitores pela paragem do Peão. Nada foi combinado entre os bloggers que ainda aqui escreviam, cada vez mais espaçadamente. Houve intenções de renovação mas que barraram nos compromissos profissionais, familiares e/ou na falta de disponibilidade pessoal. Contudo, creio que vou ao encontro do entendimento de todos ao dar esta explicação. Vamo-nos encontrando por aí. Quem quiser, pode dizer na caixa de comentários por onde anda. Então, bons debates! E bom 2014!!!

PS: e porque o Peão sempre fez questão de apostar no humor, deixo-vos com uma citação relativa à presente quadra da autoria de um antigo Presidente da República, conhecido pelas suas intervenções charadísticas e cujo espírito conformista infelizmente faz lembrar o de outro ocupante do cargo…

Citação antológica de passagem de ano do PR Américo Tomás, 1.º discurso do 2.º mandato:
Decorreu célere, como os que o precederam, o ano que acabou de sumir-se na voragem do tempo. Outro o substituiu, para uma vida igualmente efémera. Nesta mutação constante, afigura-se haver agora um fenómeno de visível incongruência, pois, quando tudo se processa a ritmo que se acelera constantemente, pareceria lógico que de tal circunstância resultasse um aparente alongamento no tempo e não precisamente o inverso
in Segundo mandato na chefia do Estado – Mensagens e alguns discursos do senhor almirante Américo Thomaz
(Lisboa, Sec.ª de Estado da Informação e Turismo, 1972, p. 17)

quarta-feira, 29 de maio de 2013

Toutes mes Félicitations!!!

A Vincent et Bruno, et a la ville de Montpellier!

O erro crasso português: défice de investimento no território e no conhecimento

Entrámos na União Europeia e perdemos uma boa oportunidade para acelerar opções certas. Agora, mais do que lamentar, devíamos corrigir rota. Que está muito para além de austeritarismos. Quem o diz é o reitor António Sampaio da Nóvoa, numa recente entrevista marcante.
Alguns dos temas mais relevantes são:
- o papel da universidade para Portugal pensar o seu futuro;
- combate ao produtivismo académico e mercantilização das universidades;
- a dimensão profissionalizante da universidade;
- a necessidade de diferenciar os papéis da universidade e do centro de formação profissional.
Ver excertos desses temas neste post de António Figueiredo.
É um bom aperitivo para a sua intervenção de amanhã, no encontro «Libertar Portugal da Austeridade» (Aula Magna da Universidade de Lisboa, 21h30), que assinala os 2 anos da intervenção externa em Portugal. Intervirão ainda Mário Soares, Rosário Gama (Apre!), Ramos Preto (PS), João Ferreira (PCP) e Cecília Honório (BE).

segunda-feira, 20 de maio de 2013

Quando o PR convoca uma reunião de ficção científica, qual deve ser a resposta?

Concentração «Obviamente estão todos demitidos», à porta do Conselho de Estado de hoje, a partir das 17h nos jardins de Belém, Lisboa (organização: movimento cívico «Que se Lixe a Troika»).
*
Sugestão de leitura: «Cavaco quer discutir o pós-troika sem assumir crise política e o ano que falta»

sexta-feira, 17 de maio de 2013

Do grandolando ao gargalhando

Ataque de riso colectivo na apresentação, pelo ministro Vítor Raspar, do livro Desta vez é diferente: oito séculos de loucura financeira, dos inefáveis Carmen Reinhart e Kenneth Rogoff. A loucura financeira apresentada pelo maior especialista vivo no tema, o livro de catequese da austeridade. Detalhes aqui.

Leilão de imóvel

Acabou por não ser arrematado.
Azar o nosso.
Para acompanhar com a leitura de «Revelado o terceiro segredo de Cavaco», por Ferreira Fernandes.



quarta-feira, 8 de maio de 2013

Da guerra militar à guerra económica: a mesma estupidez

Muitos jovens hoje não sabem a importância do dia 8 de Maio de 1945.
Foi nesse dia que a Alemanha nazi assinou em Berlim a sua rendição às Forças Aliadas, pondo fim a um período negro da história da Europa e do Mundo.
Essa não foi uma vitória deste ou daquele exército, mas de todos os povos da Europa, contra o nazismo, que representou durante muitos anos o maior inimigo da liberdade e do progresso.
Ao relembrarmos, 68 anos depois, esta data, não podemos ignorar que a Europa e o mundo em geral enfrentam hoje uma nova ameaça, que não sendo aparentemente tão violenta como foi o nazismo, está a deixar um rasto de destruição e miséria por todo o planeta, sobretudo nas zonas mais frágeis, como o chamado 3º mundo e agora também os chamados países “periféricos” da Europa.
Refiro-me aos novos “donos do mundo”, as cercas de 500 empresas que detêm sozinhas mais de 50% de todos os bens da Humanidade, e que deste modo obtiveram um poder sem precedentes, submetendo a si Estados inteiros, corrompendo os políticos, e controlando assim a Europa e o Mundo, através de organizações como o FMI, o Banco Mundial, o Banco Central Europeu, etc.
Tal como os nazis, seus antecessores, estes donos do mundo aspiram a escravizar os povos da Europa e do mundo, pondo-os ao serviço de uma máquina de exploração, onde os direitos dos homens são sistematicamente triturados e sacrificados aos interesses dos grandes grupos financeiros.
Para estes novos nazis, amplamente representados nos governos da Europa de hoje, só contam os chamados “interesses do mercado”, ou seja, o enriquecimento sem limites e absolutamente imoral de uma pequena elite de privilegiados.
Os restantes “que aguentem”, segundo a frase tristemente célebre de um dos representantes desses vampiros em Portugal. E quando se diz “que aguentem”, está-se a falar da condenação de milhões de famílias à miséria, da usurpação dos direitos mais elementares, como a habitação, a saúde e a educação.
É por isso que hoje, ao comemorar o 8 de Maio, os povos da Europa devem unir de novo os seus esforços, numa luta sem tréguas contra a nova forma de nazismo. Luta que será certamente muito dura, mas cuja vitória é tão inevitável como foi a vitória de 8 de Maio de 1945.
Assim como hoje nós comemoramos esta data, homenageando os mais velhos de nós e os nossos antepassados que participaram nessa luta heróica, espero que os nossos filhos e os seus descendentes tenham no futuro uma nova data a comemorar: a da vitória contra a Troika e as forças reaccionárias que ela representa.

PL

sábado, 27 de abril de 2013

Para rir um bocado com o falhanço científico da austeridade (a bem dizer não sei se é para rir ou para chorar...)

(em complemento do post do Daniel ali em baixo)

Primeira parte - o erro básico na folha Excel

 
Segunda parte - o jovem estudante que precisou de menos um quarto de hora para descobrir o erro

 

sexta-feira, 26 de abril de 2013

Joaquim Furtado e João Paulo Guerra contam-nos o que era viver sob censura

Podem ouvi-los em jeito irónico e mordaz no excelente programa Provedor do Ouvinte, episódio 29: «Um programa sobre o pré-25 de Abril. As histórias de Joaquim Furtado e João Paulo Guerra».
Falam de várias censuras aos media no ocaso ditatorial: a censura política, a económica e empresarial (tão pouca falada...; o RCP, os accionistas farmacêuticos, o pó talco marado dos outros e a censura empresarial indígena), a auto-censura (tão difícil de admitir...), os bufos que denunciavam a passagem de canções proibidas na rádio...
Foi hoje mas está gravado e disponibilizado na internet, para quem não pôde sintonizar a Antena 1 a meio da tarde (deixo o link aí em cima).

Sobe de tom a contestação científica às teses pró-austeridade

quinta-feira, 18 de abril de 2013

O grande logro

O principal estudo inspirador do actual austeritarismo europeu tem erros de palmatória, que foram descobertos recentemente por académicos da Universidade de Massachussets. Incluindo um estudante de doutoramento!
Vai por água abaixo a caução científica acenada por políticos nefastos como Victor Gaspar e o governador Carlos Costa, que neles se suportavam para justificarem gravosas políticas de austeridade e medidas cegas de corte acentuado da dívida pública.
Segundo os revisores científicos deste artigo, intitulado «Growth in a time of debt» (Crescimento num tempo de dívida), os países com dívida pública relativamente alta não têm um crescimento do PIB significativamente menor.
Mas mesmo que assim fosse, não é matando o paciente que se cura a doença. Isto parece de bom senso elementar. Porém, é essa a via que está a ser seguida, pelo menos na Grécia, no Chipre, em Portugal. Esperemos que a Irlanda, Espanha e os outros resistam, mas o buraco negro já paira por aí...
O Nobel da Economia Paul Krugman veio dizer que desabou o «edifício intelectual da economia da austeridade».
O neo-liberalismo reinante só se mantém com a multiplicação das mentiras. Antes, havia sido o líder do BCE, Mario Draghi, e a sua trapaça do crescimento salarial acima da produtividade nos países da Europa do Sul e França como causa da crise europeia.
Mas já há um novo episódio neste grande logro: «Merkel defende que o salário mínimo é a causa do desemprego»... na Europa!!!

sexta-feira, 12 de abril de 2013

Alternativa progressista: a política é também a arte de negociar (resumindo: entendam-se, porra!)

[...] O problema é que, ao contrário do que acontece à direita, governos pluripartidários à esquerda estão interditos.
O bloqueio à esquerda tem, em Portugal, razões históricas profundas: o PCP ter sido, durante a ditadura, hegemónico na oposição; a democracia ter nascido de um combate feroz entre as várias forças de esquerda; o PS ter-se implantado no País contra o PCP e em aliança com a direita; o adormecimento, por meio século, do nosso movimento sindical, muito dependente das lógicas partidárias; um movimento social-democrata (aqui representado pelo PS) que, ao contrário da maioria dos países europeus, não tem raízes no movimento operário e nos sindicatos; a debilidade da nossa sociedade civil. Tudo contribui para criar fronteiras estanques à esquerda. Na realidade, as grandes clivagens ideológicas foram, nos últimos 40 anos, feitas no interior da esquerda e não entre a esquerda e a direita [...].
Só que nos últimos 40 anos muita coisa mudou. E a verdade é que a direita, que tinha uma posição ideológica envergonhada, se tornou agressiva e ultraliberal. Ou seja, as condições exigem que a esquerda consiga trabalhar para os entendimentos que nunca considerou necessários.
Não escondo que não é apenas o passado que torna este entendimento difícil. Juntar a autosuficiência do PCP, a cultura de contrapoder do BE e a cultura de cedência do PS nunca seria fácil. Há, ainda assim, três denominadores comuns que neste momento poderiam garantir um governo de esquerda: o diagnóstico da crise [...], a convicção de que apenas uma política pública para o crescimento económico nos pode tirar deste sufoco e a certeza de que o equilíbrio das contas públicas não passa pela redução das funções sociais do Estado. Se estiverem de acordo nestas matérias, a grande fronteira política pode finalmente fazer-se, em Portugal, entre a esquerda e a direita.
Um governo de esquerda, fosse ele qual fosse, seria hoje um governo de emergência nacional. Com dois objectivos: libertar-nos da intervenção externa e retirar-nos da crise aguda sem pôr em causa a democracia e as funções sociais do Estado.

(continue a ler este post certeiro de Daniel Oliveira em
«Impasse: à esquerda, na caminha é que se está bem (IV)»;
para quem possa achar esta questão bizantina ou ainda precoce, sff leia isto)

Vencer a crise, com propostas sectoriais

Realiza-se amanhã a 2.ª sessão de conferências Vencer a Crise, do Congresso Democrático das Alternativas, desta feita sob o mote «Vencer a Crise com a Segurança Social». Começa às 14h30, no auditório do Sindicato dos Trabalhadores das Empresas do Grupo CGD, no Largo Machado de Assis, lote A, em Lisboa (próximo da Av.ª de Roma – estação de metro Roma). Para mais detalhes vd. aqui.
A 1.ª sessão foi sobre «Vencer a crise com o Serviço Nacional de Saúde», e a 3.ª será sobre «Vencer a Crise com a Educação Pública».
Este ciclo encerra numa conferência final intitulada «Vencer a Crise com o Estado Social e com a Democracia», que se realiza a 11 de Maio.

quinta-feira, 11 de abril de 2013

Intimidação, mentira e miséria: a receita desta democracia «musculada»

Obviamente, como na Hungria, o objectivo [para Portugal] é uma ditadura política, ou uma democracia "musculada", uma vez que estamos na Europa. Pegando no passado nacional, o exemplo seguido é o da ditadura por via das finanças públicas. É isso, com as palavras medidas e aqui guardadas desde há meses. O confronto com o T[ribunal] C[onstitucional] foi para isso, agora é claro. E com mentiras descaradas pelo meio, como a de que a troika vem cá proximamente por motivos de urgência, o que não é afinal verdade, pois a visita estava agendada; ou a associação da concessão de mais tempo pelas instituições da troika a mais cortes de despesa, o que é falso, pois a reunião que se avizinha é formal; entre muitas outras mentiras. O que fazer? Será preciso voltar para a rua, seguramente. E, mais uma vez, de forma imaginativa. Chega!
PS: A confirmação de uma das mentiras acima apontadas.

(Pedro Lains, «Este blogue...», 9/IV)

Note-se bem, sem dúvidas, sem hesitações, coerentemente, sem especulação: o presente Governo está a levar Portugal pelo caminho que a Grécia tem seguido nos últimos 4 a 5 anos. Que não haja dúvidas sobre isso. Portugal não está a seguir nem a Irlanda, nem Espanha, nem Itália. Está a seguir a Grécia. Em economia, com números, estas coisas não deixam margem para dúvidas. Sob uma comprovada espiral recessiva, o Governo continua a tomar medidas recessivas. Há alternativas? Há sempre. O Governo podia começar por não fazer o que está a fazer com gosto. A seguir, podia tentar não fazer o que está a fazer. Verá que, com esses dois passos, as alternativas aparecerão como cogumelos.
(Pedro Lains, «O caminho da Grécia», 10/IV)

quarta-feira, 10 de abril de 2013

«Não há pior política do que a política do pior»

«Quem, num quadro de grande contenção e dificuldade, tem procurado assegurar o normal funcionamento das instituições, sente-se enganado com esta medida cega e contrária aos interesses do país», argumenta António Sampaio da Nóvoa, que considera que o congelamento de despesas decidido por Vítor Gaspar «é um gesto insensato e inaceitável, que não resolve qualquer problema e que põe em causa, seriamente, o futuro de Portugal e das suas instituições». «O Governo utiliza o pior da autoridade para interromper o Estado de direito e para instaurar um Estado de excepção. Levado à letra, o despacho do ministro das Finanças bloqueia a mais simples das despesas, seja ela qual for. Apenas três exemplos, entre milhares de outros. Ficamos impedidos de comprar produtos correntes para os nossos laboratórios, de adquirir bens alimentares para as nossas cantinas ou de comprar papel para os diplomas dos nossos alunos. É assim que se resolvem os problemas de Portugal?» (in "Uma medida cega que fecha o país e lança o caos, avisa reitor de Lisboa", Público on line).

Face aos inevitáveis efeitos desestruturadores deste despacho inaudito, indiciador de ausência de plano B, o que cabe ao PR fazer? A Constituição é clara no seu art.º 120.º: «O Presidente da República representa a República Portuguesa, garante a independência nacional, a unidade do Estado e o regular funcionamento das instituições democráticas e é, por inerência, Comandante Supremo das Forças Armadas».

terça-feira, 9 de abril de 2013

Anatomia de um crime

18 minutos com 15 críticas à instituição máxima da justiça portuguesa (cf. aqui). É quase uma crítica por minuto. Em vez de explanar um obrigatório plano B, o premiê luso optou por afrontar a decisão dum órgão soberano da República Portuguesa. Demonstrou incultura democrática e má-fé. E comprovou uma denúncia anterior: que a insistência em medidas visando a desvalorização pecuniária dos funcionários públicos segue um plano de compressão salarial dos portugueses (exceptuando as elites, claro).
Se puder, este governo irá degradar ao máximo o Estado social, metendo na gaveta a incontornável redução substantiva dos lucros usurários das parcerias público-privadas, que chegam a atingir 17%. Ah, e o Banco Central Europeu parece que também está a lucrar com a desgraça alheia.
Mais palavras para quê? É o servilismo à portuguesa. Já tem alguma tradição. Recua a 1580. E podia ter começado em 1383-85. Capitulação? Novos rótulos para vinho velho, quem diria.

sexta-feira, 5 de abril de 2013

Depois da cegueira, a mentira ocultada (ou as trampas de Draghi para encolher salários...)

O grave é que o título principal desde post não é uma «frase batida» para martirizar o já fustigado cidadão português; remete para a conduta inaudita do líder do Banco Central Europeu. Em reunião do Eurogrupo, Mario Draghi, é dele que falo, refutou pedidos de inversão do austeritarismo (como os do presidente francês) contrapondo que a crise europeia foi causada por crescimento salarial acima da produtividade nos países da Europa do Sul e França, devendo estes seguir o exemplo alemão. Sucede que isto é uma falácia. E foi descoberta por um daqueles economistas que aindam se dão ao trabalho de conferir os dados apresentados pelos líderes da Europa: trata-se de Andrew Watt (cf. «Mario Draghi's Economic Ideology Revealed?», in Social Europe Journal). Esquematicamente, o logro de Draghi foi o de ter comparado o incomparável. Watt fez as contas usando indicadores comparáveis e deu uma coisa quase oposta, ou seja: em França e Espanha os salários não cresceram demasiado acima da produtividade (apud norma de estabilidade imposta pelo próprio BCE), enquanto na Alemanha os salários cresceram demasiado abaixo da produtividade, sendo isso causa maior do desequilíbrio dentro da união monetária, desequilíbrio esse que foi o principal factor da crise europeia.

Cegueira ideológica é uma coisa, mentira intencional é outra. Esta última não pode ser aceite no debate público, quanto mais no debate decisório. Quem aceitará políticas baseadas na manipulação grosseira dos dados?
A denúncia foi aprofundada por outro economista, o professor universitário espanhol Juan Torres López, em «Las trampas de Draghi para bajar salarios». Há tradução portuguesa aqui.

segunda-feira, 1 de abril de 2013

Portugal: 3.º país europeu mais desigual (se não acredita, confira a estatística)

O pior é que isso, em regra, significa maior pobreza. É isso aí, se ainda hesita, consulte a estatística oficial europeia aqui. São valores relativos a 2009, se fossem de 2012 seriam piores, ou há dúvidas? Já no extremo oposto, com menores desigualdades, estavam então a Eslovénia, a Suécia e a Hungria. Dois ex-estados comunistas e um social-democrata, custa a acreditar, não é? Para consolo, talvez sirva dizer que nos antípodas também figuram ex-estados comunistas, mas doutra área, o Báltico.
Quem quiser aprofundar informação sobre Portugal e o contexto internacional pode ler as comunicações ao colóquio «Desigualdade e Pobreza», com contributos de Nuno de Almeida Alves, Renato Miguel do Carmo, Frederico Cantante, Catarina Cruz, Paulo Costa Santos e Alfredo Bruto da Costa.

terça-feira, 26 de março de 2013

A contra-informação como estratégia para condicionar a opinião pública e a decisão política

Tem corrido nos media que a concessão pela troika da nova tranche de 4 mil milhões (agora 'engordada' para 5,6 m.m.) a Portugal depende de plano de cortes no valor de 4 mil milhões (a famosa «reforma do Estado» que o premiê Passos Coelho tirou da cartola no final de 2012). Sucede que isso é falso, é pura contra-informação governamental. O próprio chede da missão do FMI a Portugal, Abebe Sellassie, assegurou à agência noticiosa LUSA que não há qualquer relação entre as questões, até porque a reforma do Estado é coisa para demorar anos, apenas um atraso na libertação da verba por razões processuais, sendo que só será pago em Maio próximo (vd. «FMI volta a mostrar-se surpreendido com aumento do desemprego»; tb. em texto do DN de ontem, p. 33). Por isso não se percebe a manchete de hoje do diário i: «Próxima tranche depende de corte de 5,6 mil milhões de euros», incrivelmene copiada por outros matutinos (vd. DN aqui). Quer dizer, os assessores governamentais assobiam ao ouvido do jornalista (seja da LUSA ou directamente aos diários) e os jornais aparecem imediatamente com as parangonas pretendidas. Vale tudo?

segunda-feira, 25 de março de 2013

É oficial, Chipre é de facto o primeiro país a sair do Euro.

...pelo menos é o que argumenta Paul Krugman (entre outros). Sinceramente, com cinco países em dezassete sob intervenção da Troika em três anos (e mais alguns em lista de espera) ainda acha que o Euro se vai aguentar? Eu também não.

sábado, 23 de março de 2013

João Honrado (1929-2013), o alentejano do MUD-Juvenil

Faleceu ontem um dos últimos membros mais destacados do MUD-Juvenil. Foi preso pela polícia política em 1947, na leva que também levou Mário Soares, Júlio Pomar, José Magalhães Godinho e outros para Caxias.
Seria preso novamente em 1949 e 1962, desta última havendo eco do seu discurso de resistência.
Foi um dos principais arautos da sobrevivência do Diário do Alentejo no início da década de 1980, jornal regional de referência.
Na imagem: reprodução de desenho de Júlio Pomar, feito na prisão a 11/V/1947.

Óscar Lopes (1917-2013): uma história literária inovadora e marcante

É um dos grandes pensadores portugueses que se vai, mas ainda não é o último humanista, calma. Felizmente, ainda há muitos por cá. Foi um ensaísta influente, sem esconder a sua essência: pensador marxista. Para si, tão importante quanto a literatura era a sua intervenção cívica antifascista. A História da literatura portuguesa, lançada em 1953, vai ficar como marco. A seu respeito, vale a pena ler os depoimentos de Carlos Reis, de António Guerreiro e de Isabel Pires de Lima.
Dele respigo uma reflexão premonitória sobre a Europa, com quase 15 anos:
«Como é que vê o futuro da Europa?
A vida está ser decidida por um grupo muito pequeno de pessoas. O Parlamento Europeu tem muita pouca expressão. Todo o problema europeu está na maneira como se constrói». (in Público, 8/VIII/1999)

sexta-feira, 22 de março de 2013

Governo belga denuncia 'dumping social' na Alemanha: é bom saber-se tudo sobre o modelo que alguns querem impingir à Europa, para se poder optar em consciência

Le ministre de l’Economie Johan Vande Lanotte et la ministre de l’Emploi Monica De Coninck ont décidé de porter plainte devant la Commission européenne contre les autorités allemandes afin de faire cesser le dumping social dans ce pays. (in jornal belga Le Soir, 19/III/2013)
Nb: informação em português aqui.

quinta-feira, 21 de março de 2013

Ó sff, um novo amanhecer aqui para o sr. do canto!

Depois da 'solução' do Eurogrupo para o Chipre, em violação da regra decidida pela própria UE de não taxar depósitos abaixo de 100 mil euros, só resta uma saída, e não é só para o caso português. Isto se, porventura, tiverem ainda um pingo de decência. Se não tiverem, o que é o mais provável, terão que ser empurrados. Espero que por via da convergência de esforços, de programas alternativos e de eleições bem expressivas.
Nb: imagem retirada daqui.

quinta-feira, 14 de março de 2013

Francisco, o 'amâricano': mudar alguma coisa para tudo ficar na mesma?

É o que parece ter sucedido com este veloz fumo branco que saiu de chaminé vaticana. A um bispo gerado em solo 'amâricano', positivo em termos de des-eurocentrização e do apoio a perseguidos pela ditadura militar argentina (apesar do seu alegado envolvimento em casos denunciados por jornalistas e grupos de defesa dos direitos humanos: cf. aqui e aqui), contrapõe-se o perfil ortodoxo em termos 'fracturantes' (ivg, casamento igualitário) e, last but not the least, uns costados já vergados por 76 velinhas. Mas, então, espera aí: não se disse que a resignação de Bento XVI era devido também ao cansaço? O 'novo' tem a mesma idade... Nova solução de transição ou um sopro renovador, ainda que não extensível às questões fracturantes?
Nb: este post foi corrigido na parte relativa ao seu passado na ditadura militar e na pergunta final.

Memórias da autoconstrução

João Baía lança hoje o seu livro SAAL e autoconstrução em Coimbra - memórias dos moradores do Bairro da Relvinha 1954-1976, versão revista da sua tese de mestrado. A apresentação cabe à historiadora Luísa Tiago de Oliveira, especialista em História oral, e ao cineasta João Dias, autor de documentário sobre a autoconstrução no Porto. O local é a livraria Pó dos Livros, em Lisboa, pelas 18h. Mais info aqui.

quarta-feira, 6 de março de 2013

Meia derrota

Por muita simpatia que me possa suscitar, este tipo de discurso de Boaventura Sousa Santos é meia derrota. Se queremos, à esquerda, uma sociedade decente (mais igualitária, mais justa), e diametralmente oposta à que nos é imposta actualmente, temos que saber responder à questão: "como é que vamos pagar por essa sociedade decente?". E a boa notícia é que respostas não faltam. Por que raio estar a pôr-se à margem do debate económico? Sim, este discurso "a vida está acima da dívida" é apenas a recusar o debate económico por razões morais e ideológicas, é enfiar a cabeça na areia tipo avestruz. Isto é um tiro no pé, porque se há coisa que esta crise mostra é que a política actual é, para além de injusta e iníqua, MÁ POLÍTICA ECONÓMICA. A produtividade baixa (recessão), a dívida aumenta (ao contrário dos objectivos anunciados), e o desemprego dispara. A esquerda tem que pôr o debate económico no centro do debate político. As políticas económicas que deviam ser da esquerda já nos tiraram de crises como esta (New Deal, Marshal Plan, etc...). Há bons economistas de esquerda com propostas para sair desta crise, Paul Krugman, Joe Stiglitz (os dois são Nobel), Yanis Varoufakis, etc... A esquerda devia recuperar essas propostas e pô-las no centro do debate em vez de divagar em diletantismos estéreis.

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

O povo é quem mais ordena

Sábado próximo, as ruas de Portugal e arredores voltarão a transbordar, de rios de gente aspirando a um país melhor, mais justo e solidário. O convite vem dum novo movimento social em que muitos se revêem e que já deixou marca. Fica aqui a parte inicial do convite:
Um grupo de pessoas convoca um processo de mobilização e manifestação contra a troika e a austeridade para o próximo dia 2 de Março.
Em Setembro, Outubro e Novembro [de 2012] enchemos as ruas mostrando claramente que o povo está contra as medidas austeritárias e destruidoras impostas pelo governo e seus aliados do Fundo Monetário Internacional, da Comissão Europeia e do Banco Central Europeu – a troika.
 Derrotadas as alterações à TSU, logo apareceram novas medidas ainda mais gravosas. O OE para 2013 e as novas propostas do FMI, congeminadas com o governo, disparam certeiramente contra os direitos do trabalho, contra os serviços públicos, contra a escola pública e o Serviço Nacional de Saúde, contra a Cultura, contra tudo o que é nosso por direito, e acertam no coração de cada um e cada uma de nós. Por todo o lado, crescem o desemprego e a precariedade, a emigração, as privatizações selvagens, a venda a saldo de empresas públicas, enquanto se reduz o custo do trabalho.

 Não aguentamos mais o roubo e a agressão (continuar a ler).
Haverá desfiles em dezenas de cidades portuguesas, e ainda em cidades europeias (Barcelona, Paris, Londres) e americanas, como Boston. Mais informações e textos de subscritores da iniciativa no site oficial do movimento.

Calem-se os agoirentos, já há governo em Itália: Berlusconi será ministro da justiça...

... em mais uma missão de sacrifício em prol do país! Por seu turno, Bossi será ministro do desporto e agricultura. Temos ou não temos patriotas? Está visto, os maledicentes podem arrumar as botas.

Grândola, a tua vontade

Tem feito caminho a tese de que «Grândola, vila morena» não pode ser usada em democracia, pois foi feita em tempo de ditadura e só aí faz sentido. Dã?
Quem diz estas coisas já parou um instante para matutar no que disse? Já leram a letra? Essa canção de José Afonso é uma canção de intervenção e, como qualquer canção desse género, pode ser usada em qualquer contexto. Sendo uma canção de intervenção ligada umbilicalmente à oposição de esquerda à ditadura salazarista é compreensível que a oposição de esquerda actual que se reconhece nesse legado de luta se sinta no direito (e, para muitos, no dever ético) de a usar.
É que, para muitos portugueses, cada vez mais, este governo perdeu a sua legitimidade político-social (que não eleitoral) para governar em seu nome, e querem que o governo sai ou substitua as suas políticas de austeritarismo assimétrico por políticas de desenvolvimento e justiça social.

Outra ideia estapafúrdia é a de que as pessoas que a cantam estão a censurar quem quer falar. Como disse? Esta é bem torcida: não e não! Depois dos manifestantes cantarem, quem quer falar pode fazê-lo, tem é que aguentar um bocadinho (sendo pago com o dinheiro dos contribuintes, não há-de ser essa espera que nos há-de fazer mossa na bolsa). Todos temos direito à liberdade de expressão, certo? Então? Sobre esta questão vale a pena ler este excelente texto de Viriato Soromenho Marques chamando a atenção aos condoídos com o personagem Relvas para o deve e haver das feitorias do mesmo.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Afinal não é oferta de emprego, são só vias ínvias de traficar contratos para imigrantes?!

«Fábrica de plásticos procura Nobel da química. Salário mínimo garantido», por Daniel Oliveira

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Portugal, um país cheio de classe

Na próxima sexta-feira, Manuel Carvalho da Silva e Rui Tavares apresentarão em Lisboa um oportuno livro, Portugal, uma sociedade de classes – polarização social e vulnerabilidade, edição conjunta do Le Monde diplomatique e das Edições 70 (será no espaço CES–Lisboa, Picoas Plaza, R. do Viriato, 13 lj 117/118, pelas 18h; convite aqui).
O livro foi organizado por Renato Miguel do Carmo e conta com 10 contributos de outros tantos autores.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Immanuel Wallerstein em Lisboa (ou o tempo que o capitalismo leva a definhar)

É já amanhã que o sociólogo Immanuel Wallerstein vem conferenciar ao Portugal em coma sobre a «Crise e reconfigurações no âmbito do Sistema-Mundo» (Fundação Calouste Gulbenkian, auditório 2, 18h30-20h30).
Haverá emissão em directo da conferência via internet (aceder em http://live.fccn.pt/fcg/, para utilizadores do sistema operativo Windows; ou em rtsp://wms.fccn.pt/fcg, para sistemas operativos baseados em Linux).

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Boa safra eleitoral: Merkel com nova derrota e Israel sem 'onda' bélica

Saiu-lhes o tiro pela culatra e é bem feito.
Merkel esperava manter o predomínio político-partidário no influente e populoso lander da Baixa Saxónia, só que o 'volteface' da realidade transferiu a maioria para o bloco de centro-esquerda e, melhor ainda, retirou-lhe a maioria nas duas câmaras. Agora, pode ser vetada e alvo de contra-medidas legislativas. Aumenta a pressão sobre os seus desmandos e a sua alardeada renovação presidencial.
Quanto a Israel, também os media mais preguiçosos davam 'onda' de direita, a cavalgar o belicismo anti-palestiniano. Afinal, o novo parlamento ficou equilibrado e o actual líder belicoso estará a sentir um amargo de boca: «Sondagens dão vitória a Netanyahu, partido de centro-esquerda Yesh Atid surpreende».

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Porque um país precisa de educação pública decente...

... vem aí nova Manif Nacional de Professores, a 26 de Janeiro, no Marquês de Pombal- Lx, 15h.
E porque a acção cívica e política em prol duma educação decente não se deve resumir às manifestações, por muito importantes que estas sejam, aconselho a leitura deste post de João Tilly, porque tem propostas merecedoras de reflexão.

terça-feira, 15 de janeiro de 2013

A sociedade civil «crítica, exigente e madura» que eles andam a escutar...

Piou cá para fora esta manhã que o governo decidiu 'reservar' o acesso ao seu encontro de abertura à «sociedade civil». Caiu logo um coro de críticas, sem fundamento nem tino, como diria o VPV. Nós adiantamo-nos ao inefável VPV e mostramos na imagem como tudo decorre sob normalidade.

Afinal de contas, qual é a composição da dívida pública portuguesa?

Essa resposta será dada no próximo sábado, no I Encontro Nacional da Iniciativa para uma Auditoria Cidadã à Dívida, que decorrerá no Instituto Franco Português, em Lisboa.
Entretanto, está já disponível uma entrevista a um dos membros desta plataforma, o economista Nuno Teles.

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Estamos metidos no faroeste...

quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Paulo Rocha (1935-2012): mestre do cinema novo


Só por Verdes anos (1963) e Mudar de vida (1966) já teria valido uma carreira. Mas houve mais. Um mestre para muitos cineastas, apesar da sua notória discrição.
Na imagem, reprodução de frame do filme Verdes anos, da parte introdutória do mesmo. O campo às portas do Areeiro, uma das portas da cidade de Lisboa, capital do império. Com música de Carlos Paredes e argumento do cineasta e de Nuno Bragança. Filme completo aqui.
Apresentação do belíssimo Mudar de vida, com depoimento de Paulo Rocha, aqui.